TESTEMUNHO DA ASSOCIAÇÂO GAITA DE FOLES

"Gaita-de-fole", "Gaita Mirandesa" ou "Gaita Transmontana" - Portugal, Trás-os-Montes



Gaita-de-fole; "Gaita Transmontana" ou "Gaita Mirandesa"
Construção: presumivelmente anterior a 1958. Pertencente a Joaquim Ventura, Caçarelhos, Portugal.
Materiais: ponteiros em freixo e enguelgue, anéis de corno, bordão em madeira de
enguelgue e fole de cabrito.
Tonalidade: aprox. Si / Lá - Digitação: aberta.
Dois tubos sonoros: bordão cilíndrico de palheta simples e ponteiro cónico com palheta dupla.
Esta gaita-de-fole pertenceu ao gaiteiro Joaquim do Nascimento Fernandes Ventura, natural de Caçarelhos/Vimioso, Trás-os-Montes. Trata-se de um exemplar muito interessante, uma vez que tem características comuns com muitos outros instrumentos da região, sobretudo no torneado e ornamentações dos tubos sonoros (muito semelhantes aos instrumentos construídos por Rodrigo Fernandes, outro gaiteiro e artesão transmontano). Possui dois tubos sonoros e um tubo insuflador em madeira de Enguelgue ou Zelha (Acer Monspessulanum) – uma madeira muito usada na construção de gaitas nessa zona, tratando-se de uma espécie de arbusto natural das arribas do Douro, pouco conhecida e com excelentes qualidades musicais.


Detalhes de algumas peças, de cima para baixo: Primeira ou Ombreira (encaixada na buxa), Entremeia, Copa, Ponteira e Assoprete. Note-se a cor escura do Enguelgue envelhecido e os entalhes decorativos, feitos à mão.
Na realidade, esta gaita foi recuperada na oficina da Associação Gaita-de-Foles, pois encontrava-se em relativo mau estado, sendo que o fole e a vestimenta que o cobre já não são os originais, que foram substituídos. Junto com a gaita encontravam-se dois ponteiros: o primeiro, que se presume que tenha sido o original, foi construído em Enguelgue e exibe a mesma decoração que os restantes tubos sonoros, emitindo a tónica de Lá (aproximadamente). E um segundo, feito em madeira de freixo, tratando-se possivelmente de um ponteiro de construção sanabresa ou galega que foi adaptado pelo gaiteiro para afiná-lo de acordo com os padrões locais (o interior do ponteiro e os buracos melódicos mostram sinais de que foram desgastados com uma ferramenta, para aumentar o seu calibre), parecendo estar afinado em Si – a ausência de palhetas originais não permite especular muito mais sobre a real afinação destes ponteiros.


O gaiteiro Joaquim Ventura era também conhecido como “Joaquim de Gibraltar”, em virtude de ter emigrado para essa colónia britânica. Com efeito, foi lá que comprou a sua primeira gaita, por sinal uma Great Highland Bagpipe. Após regressar a Portugal, iniciou-se na aprendizagem da gaita-de-fole transmontana. Não se sabe se esta gaita terá sido construída pelo próprio (uma vez que este possuía um torno onde fazia trabalhos em madeira) ou se a terá adquirido a outro artesão.

Joaquim Ventura faleceu em 1958, quando o seu filho, José Ventura, contava 9 anos de idade. Foi este que encontrou a gaita, quase dez anos depois, a qual permanecera esquecida num resguardo para animais. Esta gaita é ainda hoje tocada pelo neto de Joaquim Ventura, João Ventura, que por vezes é acompanhado por Manuel Vicente (caixa) e Armando Vicente (bombo) - os mesmos percussionistas que outrora acompanharam o seu avô.

Associação Gaita de Foles, 2003 - Direitos Reservados

1 comentários:

Anónimo disse...

Não há sombra para dúvidas que a vossa tenacidade e forte preserverança mantém viva a alma colectiva de uma Aldeia - Caçarelhos - "na ponta do planalto mirandês " região mais uma vez condenada á desertificação. Força, transmitam à 4ª geração... .continuem...
Um elemento da diáspora - Tibério

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